Projeto da Lei Ambiental do Pantanal proíbe lavoura, confinamento bovino e instalação de hidrelétricas
O projeto de lei 343/2023, enviado pelo Governo do Estado e já em tramitação na Assembleia Legislativa, traz dispositivos que proíbem de forma expressa a exploração de uma série de atividades econômicas no Pantanal, por trazerem risco à preservação do bioma. Conforme o artigo 26, capítulo das disposições transitórias, na Área de Uso Restrito da Planície Pantaneira, será vetada a implantação de lavouras de soja, cana-de-açúcar, plantio de eucaliptos, cultivo de florestas exóticas, além da atividade de confinamento bovino, com exceção dos casos de concentração temporária de gado em períodos de cheia ou de emergência ambiental. Os cultivos já consolidados e já implantados até a publicação serão mantidos, sendo proibida a expansão, mas haverá exigência de licenciamento ambiental.
A proposta do Poder Executivo, elaborada a partir de estudos realizados por um Grupo de Trabalho formado por técnicos do Governo e do Ministério do Meio Ambiente, também impõe restrições a implantação no bioma pantaneiro de pequenas centrais hidrelétricas e de novos empreendimentos de carvoarias, podendo ser mantidos os já existentes até a data em que vencer a licença ambiental concedida.
As restrições não se aplicam aos cultivos da agricultura subsistência. Realizados em pequenas propriedades ou em posse rural familiar. Também será permitida a utilização de pastagens de espécies exóticas, reconhecidas pela Embrapa, que se adaptam bem ao Bioma, como é o caso da braquiária.
O projeto também estabelece novos parâmetros para a supressão vegetal ou conversão de pastagens nativas com o plantio das chamadas espécies exóticas. O proprietário terá de solicitar autorização ambiental que só será concedida aos imóveis rurais com Cadastro Ambiental Rural (CRA-MS); que não tenham registro de infração administrativa, transitada em julgado nos últimos três anos, referente à supressão irregular de vegetação nativa; o manejo do gado nas pastagens, a limpeza das pastagens e o uso do fogo para manejo da vegetação campestre estejam sendo conduzidos conforme as recomendações técnicas e dentro dos critérios estabelecidos no licenciamento ambiental.
Os processos de requerimento de autorização ambiental para supressão vegetal acima de 500 hectares terão de ser acompanhados do Estudo de Impacto Ambiental e o respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA). Pela regras em vigor, a exigência só é cobrada nas áreas a partir de 1.000 hectares. Nos casos em que mais da metade da área da propriedade haverá substituição da pastagem nativa, será exigido o EPA (Estudo Preliminar Ambiental), limitado até a 1.000 hectares da área total do empreendimento.
A nova lei vai prever, também, que situações já autorizadas ou mesmo realizadas de forma irregular “em um intervalo de cinco anos” serão enquadradas nos novos parâmetros. Quem cometer irregularidade vai ficar impossibilidade de ter acesso a autorizações até que demonstre ter revertido a situação que causou. Propriedades com vegetação nativa que se estendam até 60% da área poderão fazer uso de até 40% para manejo. Limpeza e retirada de espécies invasoras não serão consideradas irregulares, mas demandarão licenciamento, exceto quando se tratar de situações de limpeza com roçadeiras, foices e enxadas.
O texto admite a prática da queimada, com cautela para evitar incêndios e regras a serem fixadas pelo Executivo. Pelo projeto, alguns trechos do Pantanal são classificados como preservação permanente: salinas, veredas, landis e meandros abandonados. Será permitida a presença do gado criado de forma extensiva em locais com acesso a água, como baías, corixos, na tradição pantaneira, desde que a presença não provoque degradação.
Nas APPS e AURs (áreas de uso restrito, com vegetação típica do Pantanal, Cerrado e Mata Atlântica) o gado também poderá ser criado, se não causar prejuízo à biodiversidade, ao fluxo gênico de flora e fauna ou risco de prejudicar o solo ou bem estar das comunidades.
Até as reservas poderão ser usadas para a cria, desde que haja desde pasto e isto contribua para a redução de material vegetal que favoreça risco de incêndios florestais. Será proibido retirar vegetação em veredas, landis, salinas, capões, com a fixação de faixas para a proteção. Somente será autorizada a retirada para limpeza. A nova lei garante a manutenção Pantanal da pecuária extensiva praticada há séculos no Bioma, considerada, inclusive, como um mecanismo de proteção, pelo manejo de material que produz incêndios florestais.
*Debate na ALEMS*
O presidente da Assembleia Legislativa, Gerson Claro, afirmou que o projeto será debatido e esmiuçado pelos deputados, além de estar programada uma audiência pública nesta quarta-feira. “Abrimos para que os deputados possam ter a avaliação técnica da legislação e para que a gente possa estudar essa lei e a partir dos debates. Vai passar pelas comissões e até, impreterivelmente, dia 20 de dezembro, a gente vai ter a lei aprovada para sanção do governador. Espero que a gente possa, com muito equilíbrio e responsabilidade, produzir uma legislação que atenda a todos os interesses do sul-mato-grossense discutindo esse tema de proteção, desenvolvimento, que não é um tema individual, é um tema mundial”.
O presidente do IHP (Instituto do Homem Pantaneiro) – uma das ONGs que atua no Pantanal sul-mato-grossense –, Ângelo Rabelo, explicou que a lei contribui para a preservação e também garante a continuidade da atividade produtiva no bioma. “É indispensável, indissociável, não há como considerar a sobrevivência do bioma com a retirada do gado. Isso é uma história construída de customização, sendo moldada não só o homem pantaneiro, mas o gado. Isso trouxe um ponto de equilíbrio no bioma, a prova é as populações silvestres que nós temos hoje. O governador tomou uma atitude extremamente madura e responsável”.
“O texto hoje ficou a contento, foi uma proposta elaborada a várias mãos, a partir de muitas reuniões. Houve a participação do Ministério do Meio Ambiente, com a ministra Marina Silva, do Instituto SOS. A base do Pantanal não é somente ambiental, mas sim no tripé ambiental, social e econômico. O homem pantaneiro precisa estar lá para continuar fazendo a preservação. Temos 84% do bioma preservado há quase 300 anos. Tivemos também a criação de um fundo que vai pagar a esse produtor que faz a preservação. No decreto anterior, já entregávamos a preservação e agora teremos uma retribuição por esse serviço prestado. Tudo isso traz segurança jurídica ao produtor rural”, avalia o presidente da Famasul, Marcelo Bertoni.